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A CATÁSTROFE NO JAPÃO
II

19/03/2011


Traz prazer dor, dor prazer traz”.
Goethe, em verso posto à boca de Mefistófeles


Em artigo anterior (A catástrofe no Japão) alguns leitores acharam que sou contra aquilo que se chama de progresso, o acúmulo de
conhecimentos que tem permitido aos homens uma vida mais segura, confortável e
longeva. Nada mais distante de mim, que acredito firmemente que a centelha de
razão que possuímos é um bem precioso que precisa ser usado. A impressão que deu
essa falsa imagem foi a crítica que fiz ao uso da
energia nuclear como é feito no Japão. O uso da energia nuclear é de extremo
perigo, pois a letalidade dos potenciais acidentes não pode ser subestimada.
Países como o Brasil, por exemplo, não têm motivo para invetir nessa fonte, pois além de ter sol abundante, que
reduz o uso de energia para aquecimento e iluminação, tem potencial
hidroelétrico ainda não esgotado. Quis Deus também que aqui jazesse uma grande
quantidade de petróleo ainda não explorada.


Usina
nuclear aqui só deveria existir para efeito de pesquisa e domínio da tecnologia
e eventualmente para fins militares.


Quero
comentar dois artigos que hoje li para reforçar o meu ponto de vista. O
primeiro, publicado na Folha de São Paulo (Projeto de
Fukushima esconde uma bomba-relógio dupla
). A reportagem sumarizou o tamanho
do perigo contido no acidente nuclear japonês: “
Além de três reatores
que estão com núcleo esquentando, a piscina que guarda o chamado combustível
gasto do reator 4 está secando. E o combustível gasto
dos reatores 5 e 6 está mais de duas vezes mais quente. Isso pode gerar uma
explosão com efeitos trágicos, já que esse material -uma mistura de urânio,
plutônio e outros elementos letais- é 1 milhão de vezes mais radioativo do que o
combustível novo. Depois de queimadas no núcleo do reator, as varetas que
abrigam esse material ficam em água, tanto para resfriar o combustível quanto
para "blindar" a radiação
.” Eu desconhecia
esses detalhes técnicos, mas bem se vê que a mão humana novamente falhou e criou
uma situação de extremo perigo.


Em posição oposta, de
confiança cega na tecnologia, temos o artigo assinado por Francis Sorin, no Estadão (A
causa do acidente em Fukushima  foi banal
). “O acidente nuclear
na usina de Fukushima, no Japão, e o consequente risco
de um desastre ambiental e humano comparável apenas à explosão da usina de
Chernobyl, em 1986, foi causado pela combinação de dois fatores prosaicos: falta
de luz e falta de água
.
Sorin é
especialista da Sociedade Francesa de Energia Nuclear e obviamente está
minimizando o trágico acontecimento japonês. Sorin
concluiu: “Os riscos existem. Mas se você
analisar o que aconteceu nos últimos 50 anos, tempo no qual produzimos energia,
hoje com 440 reatores em 30 países, você percebe que é extremamente segura. Não
houve ameaça ao meio ambiente e ao homem nos países que usam tecnologia nuclear
ocidental. Se você comparar entre os danos causados por outros meios de produção
de energia, como gás, carbono, petróleo, vai concluir que o nuclear é o que
causa menos danos. O nuclear tem esse paradoxo: é a mais temida pela opinião
pública, mas é a menos danosa
.


Obviamente Francis
Sorin está interessado em manter e fazer prosperar a
indústria de engenhos nucleares da França e não releva os óbvios perigos
inerentes ao uso desse combustível. Não bastou o que houve em Chernobyl. A
energia nuclear colocou para os homens a Caixa de Pandora aberta para saírem
todos os demônios dos infernos. Fazer o que Sorin fez,
de associar o medo a energia nuclear ao medo de voar de avião é sofisma
primário: um avião, por pior que seja a tragédia que provoque, terá seus efeitos
esgotados no próprio acidente. O que estamos a ver é que em Fukushima, como em
Chernobyl, o que podemos ter é a morte para a humanidade de uma larga extensão
de terra, se não coisa ainda pior, comprometendo as futuras
gerações.


A manipulação da
energia nuclear é algo sério demais para ser deixado na mão apenas dos físicos e
técnicos envolvidos com essa indústria. A prazer do conforto gerado pela energia
nuclear pode causar enorme dor.